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domingo, 15 de agosto de 2010

Imaginar-se pobre

Se fosse possível você ouvir a minha voz, eu pediria para você fechar os olhos e tentar imaginar a situação seguinte, mas já que para sentir o que eu quero que você sinta você precisa usar os olhos para ler, então tente aguçar a criatividade mesmo estando com eles abertos.


Imagine...

Sinta-se deitado, sinta a claridade invadir seus olhos e note que já amanheceu e é hora de acordar, mas ainda deitado você programa o que tem para fazer: levantar-se logo para não se atrasar para o emprego, tomar um banho para espantar a preguiça, tomar um café-da-manhã reforçado porque a fome já está batendo forte, dar um beijo de bom-dia no esposo ou na esposa antes que este também saia, deixar os filhos no colégio e finalmente chegar ao emprego recebendo aquela bronca saudável do chefe.

Então você se levanta de uma rede não muito limpinha, e vê que ao seu redor tem apenas quatro paredes de barro. Você lembra que não tem um café-da-manhã, você não tem um emprego, seus filhos não têm colégio, seu esposo ou esposa também não tem que sair porque também não tem um trabalho. A única certeza que você tem é que a fome continua batendo forte. Você leva as mãos à cabeça em desespero porque acordou na mesma condição em que foi dormir na noite anterior, sem uma vida digna de viver. Para o mundo, se você não tem salário, não tem trabalho, não tem existência. Você olha para os lados e não sabe o que fazer para sair dali e viver diferente. Você se sente incapaz, porque não consegue ser o herói ou a heroína da família.

Você olha para cima e vê telhas quebradas e, por um momento, deseja que não haja inverno, mas se arrepende instantaneamente porque é a chuva que faz sua plantação e sua esperança crescerem e você ter comida em casa. Então você decide que a solução é consertar você mesmo o telhado. E você vai. E você volta. E nota que já está na hora de dormir de novo, então deixa a tristeza lhe invadir porque lembra que consertar o telhado foi sua única tarefa do dia, e agora você vai dormir na mesma condição em que acordou de manhã.



Por Adriane Ponte Cisne


(Texto escrito em 27 de novembro de 2009, às 06:59 A.M., para a apresentação de um seminário de Sociologia em Enfermagem, curso anterior à Psicologia)

5 comentários:

Thamila Santos disse...

De fazer sacudir na cadeira,
instigante.
eis a palavra!

ALESSANDRA MESQUITA disse...

Saudade de tu...

aline disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
aline disse...

É... faz refletir. =/
Excelente texto!

removi sem querer aqui em cima +)

Paulo Roberto disse...

Depois de ler isso me vem a mente, se "O Pequeno Príncipe" é um extraterrestre pq não vive na terra ou por que é tão humano ?

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