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domingo, 1 de maio de 2016

Canse



Canse. Não é erro de digitação de um "cansei" sem o "i". Não quero conjugar o verbo "cansar" como um desabafo sofrido no pretérito perfeito (apesar de isso estar nas entrelinhas e, se fosse um pretérito perfeito, não precisaria cansar). Quero conjugá-lo no imperativo afirmativo e convidar você a desistir.
Canse quando você estiver tentando demais e em vão; você pode estar desperdiçando ótimas opções diferentes da famosa mesma tecla. Canse e desista se o resultado não valer o suor e o tempo usados. Não me entenda mal. Não sou hipócrita, nem mercenária. Ouço, toco e canto emocionada o "Tente outra vez" do Raul Seixas. Ser persistente é importante por alimentar uma força desconhecida em si mesmo e permitir a entrada em caminhos inéditos para você, e talvez até para todos os outros. Isso é lindo e merece aplausos. Mas é sempre bom analisar se você não está sendo estúpido. Tantos "nãos" recebidos e erros cometidos podem ser um sinal da presença desse adjetivo. Aceite, ora!
Há tantas oportunidades nesse mundão-de-meu-Deus que fazem parecer sua luta tão murchinha e vã. Grandes ou apenas melhores resultados podem vir com uma simples mudança de foco. Além do mais, o desgaste de um erro recorrente pode ser cruel com a sua persistência em uma opção mais promissora. Assim, quando você decidir cansar, já vai estar cansado demais para recomeçar e seguir diferente.
Não tem problema nenhum em perder. Hoje parece se seguir uma lógica industrial, que aponta o acúmulo de vitórias comercializáveis e coroas honrosas perfeitas – que se puderem ser expostas, melhor ainda – no final de cada etapa estereotipada de uma linha de produção como um sinal de uma vida plena e bem vivida. E os produtos com defeito que surgirem no feitio são descartados e esquecidos sem chances de reciclagem e lugar numa prateleira, porque só os perfeitos têm espaço nelas. Ah, mas como os imperfeitos têm importância! E nós não somos, nem sequer parecemos, chinelas ou garrafas de refrigerante numa esteira de montagem padronizada e reta.
Óbvio, cada luta é pessoal e intransferível no final das contas. Algumas merecem a mesma insistência durante anos. Thomas Edison, por exemplo, não teria inventado a lâmpada se não tivesse errado 2.000 vezes antes do produto final (ainda assim ele disse que não errou, e eu concordo, mas essa é outra discussão), nem teria inventado a bateria se tivesse desistido antes da 25.001ª tentativa. Por isso, repito: analise. Minha dica não é nova. Músicos, filósofos, cientistas, professores, mães, pais, vovôs cheios de calos, desconhecidos na rua, a vida e a morte advertem muito sobre a preciosidade do tempo e sobre a nossa finitude.
Eu sei que é difícil largar quando se deseja muito. Acredite, eu sei. O chão some por uns dias (ou muito mais) depois da decisão e você fraqueja com a tentação de voltar. Fraqueja muito! Tanto foi empregado no mesmo objetivo que parece tão injusto não o conseguir.
Descanse, então. Troque de sonho. O justo é encontrar um que permita que você seja ilimitado em suas melhores habilidades. Um que você mesmo se valorize e alcance resultados antecessores de sorrisos e prazer.
No entanto, mesmo havendo mais contras do que prós, e você ainda achando que seu coração quer continuar à revelia da sua razão, ok. Tente ao máximo para não se arrepender depois, para que a dúvida não perturbe pairando ao redor pelo resto da vida. Eu sei que é um inferno pensar que não se tentou o suficiente, e todo mundo tem o direito a falhar o quanto necessitar para aprender, doa o que doer. Um dia vai passar e você vai precisar saber que tentou de um tudo para fazer o que achava certo. Mas assuma a responsabilidade e não diga que ninguém avisou.


APC
19 de janeiro (...) 01 de maio de 2016

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